sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

De mais um dia de histeria colectiva

Este post é um dos três que queria ter escrito ontem à noite, mas bloqueei. Hoje de manhã li este post do Crestfallen e respondi-lhe. Este post é uma adaptação da resposta que lhe deixei, revista e aumentada (acho que já sabem que eu e as rapidinhas não nos damos muito bem). Ontem stive ainda a lutar para escrever um outro badalhoco e NÃO escrever um post sobre o aborto. Para o primeiro não consegui carga badalhocal suficiente. O do aborto tem que ser escrito com um pouco mais de cabeça e menos um pouco de emoção animal pura e dura, mas com as duas na dose certa. O que não se consegue estando tão emocional em relação a este assunto. Mas vou ter que escrevê-lo, mesmo porque "devo" isso ao Bizarro (e a mim, que gosto de organizar as minhas ideias).

Resumindo, ontem estava desinspirada. Ou então estou a ficar velha e carunhosa (mas ao menos a tendinite não atacou, por isso está-se bem!).

Eu não sou contra nem a favor do dia de São Valentim nem de dias nenhuns. O que sou contra é a servidão ao mercantilismo que apela ao coração. O apelo das lojas ao consumo dos apaixonados não é visto como "sei que queres exprimir amor, por isso tenho isto que pode ajudar a dizê-lo sem ser em palavras" mas como "se não comprarares isto vais pensar que não sentes, que não és como os outros, que não és tão bom como os outros e ela/ele vai sentir o mesmo e pôr-te os cornos".

Sentiremos as coisas, na realidade? Ou sentir-nos-emos pressionados a senti-las porque o comércio e a comunicação social apertam o cerco?

Quem leu os meus posts de Natal reparou que para além das fufas e da javardice havia um sentimento de profunda insatisfação face à histeria colectiva, mercantilismo excessivo e vazio do Natal. Um sentimento que cresce de ano para ano. Eu que até restrinjo as compras ao mínimo. Reparei que o Crestfallen tinha posts idênticos com a mesma mensagem: é tudo na base do "deve ser" e não no "é". E foi tudo dominado pelas lojas. Os meus posts tinham uma outra motivação mais grave, que era um sentimento de solidão no meio de uma multidão de felizes, mas isso agora não interessa e está controlado.

O que se passa é que se o dia de S. Valentim é uma boa desculpa como outra qualquer para exprimir o amor que deveras se sente, óptimo. Mas deixar de se fazer o que se está a fazer em função de um dia, sobretudo quando não se está com vontade, isso não me parece bem. Entre outras coisas porque é falso. Se o amor ou qualquer outro sentimento é falso, o que nos resta?

Os "dias de" são interessantes para nos lembrarmos de algo: das crianças que não têm o que deviam, das mulheres que ainda sofrem por não terem os direitos de que não deviam ser privadas, da SIDA e porque mata como mata, dos animaizinhos abandonados. Tudo isto serve como um post-it que metemos de vez em quando a sugerir que pensemos em qualquer coisa e em meios de melhorar o mundo. Se é só para marcar calendário, então é escusado. Um calendário, além de nos organizar serve para marcarmos a passagem do tempo (e isso é importante, para não nos esquecermos de que ele de facto passa).

Mas uma história inteiramente diferente é a histeria e o carneirismo de fazer o que fazem os outros, só porque sim. Sem pensar sequer. Isso não tem valor nenhum: pode-se pagar com mastercard, mas não é "priceless" no sentido de não ter um preço que se possa pagar. É que priceless também pode ter visto como "valor zero". E zero não é nada. Sentimentalmente é prejuízo. Se uma relação amorosa não é uma relação de negócios, tem que dar lucro na mesma. Ao casal, não às lojas (abro uma excepção para a indústria de contraceptivos).

Celebrar o dia do aniversário é mais personalizado que um dia que o comércio definiu como bom para fazer compras. Eu também prefiro esponteneidade e seriedade nos sentimentos, mas por vezes podemos embrenhar-nos no nosso dia-a-dia e esquecer a passagem do tempo: as datas estão lá para soar o alarme. Mas para nos fazer pensar, não para vivermos em função delas.

O outro aspecto é o kitsh que é o dia 14 de Fevereiro: casais com cara de palermas debaixo de uma decoração foleira e à luz de velas mal cheirosas ... se a ideia de romantismo desta gente é essa, estamos mal (nota mental: as velas com cheiro fazem-me chorar, mas porque sou alérgica a um componente qualquer)!

Agora se é como a proposta que recebi de Serralves, poderia ser outra história (porque Serralves é um pedacinho de céu na Terra). Mas mesmo assim eu não quereria ter que competir com o arrulhar dos outros casais ao lado. Para falar verdade, um jantarinho em casa parece-me mais romântico e mais apropiado em muitos casos. Ou uma taça de cereais para cada, a casa sem aquecimento e os dois enrolados numa manta só a existir e a fazer mais qualquer coisinha (ou nada: também faz parte). A parte da taça dos cereais tem duas vertentes: dá energia e é menos louça para lavar. Energia para quê? Ora adivinhem!

O outro aspecto perverso do dia de São Valentim tem também que ver com quem se sente excluído. Ou porque dava valor ao dia (não é o caso) e perdeu o parceiro de algum modo. Ou porque está sozinho e se sente mais sozinho ainda nesse dia. Ou porque leva a sério coisas como "este é o dia dos encalhados".

E pronto, acabei por carneirar como os outros ao fazer um post sobre o dia dos namorados. Mas não é desprovido de sentimento, muito pelo contrário. Se vocês festejaram este dia com amor, parabéns. Se vos soube a nada... pensem!

3 comentários:

Anónimo disse...

ahahahah, adorei bobrita!!

Anónimo disse...

imaginava encontrar algo bem badalhoco como o Lupercalia etc e tal.
A criatividade vai mal!

Abobrinha disse...

Anónimo(a) 1

Óptimo!

Anónimo(a) 2

Nem só de badalhoquice vive o homem, nem a mulher. Este não era um post badalhoco nem um lamechas. Era só um post inócuo. Se não gostas, tudo bem: não se pode agradar a todos.

Quero lá saber do Lupercália! Já me chega o c*** do dia de São Valentim.