domingo, 8 de março de 2009

Feel-good movie o c***!

Tive um dia destes mais uma prova de que um filme não é só o que o realizador, os actores e a restante panafernália de gente que o fez querem que seja: o filme é muito o que quem o vê sente. Tinham-me dito (e está anunciado) que o "Quem quer ser milionário" era um feel-good movie, que a pessoa saía de lá bem disposta... e eu saí de lá meia agoniada!

Recordo que já aqui afirmei que acho filmes com cabeças cortadas, motosserras, sangue a jorrar e outros que tais relaxantes. Mantenho o que disse. Vi também o "Trainspotting" como se estivesse drogada (coisa que nunca estive) e achei-o o máximo, embora friamente falando o filme seja perfeitamente horrível e retrate várias realidades horríveis, com uma banda sonora brilhante.

Mete-me impressão a maneira como o apresentador humilha o concorrente porque é o menino do chá do call centre (nem categoria nem cultura para assistente tem!). Na realidade ele é bem pior que isso: uma criatura que só está viva e íntegra por uma qualquer piada do Universo. Só pode, porque por lógica não é! Mas o que me desarmou profundamente foi a história de vida do protagonista, representativa da de um número inaceitável de seres humanos. Conflitos religiosos, ganância pura e simples, desrespeito pelo ser humano e pelo que ele tem de mais frágil: as crianças e as mulheres.

A cena em que uma criança é cega para conseguir mais esmolas fez-me controlar para não chorar (quando cheguei ao carro já não me aguentei) e marcou-me. Ver as crianças na lixeira, sujas, tratadas como objectos deu-me vontade de saltar para dentro do ecrã, pegar nelas, levá-las para casa e tomar conta delas (OK, sinto o mesmo quando vejo o Jude Law em filme, mas aí os instintos são diferentes... embora envolvam vagamente crianças... concretamente a sua fabricação por métodos naturais). Deu-me vontade de sorrir a alegria das crianças e a sua inacreditável capacidade de brincar e divertir-se e fazer asneiras que adulto nenhum teria imaginação para fazer. Mesmo no mais abjecto bairro de lata do mundo. Para crescerem cedo demais, quando no nosso mundinho há trintões ainda a jogar criquete na pista de aterragem de aviões e se esquecem de que têm que crescer e sentir felicidade nas responsabilidades que a idade traz consigo.

O filme está bem feito, de facto há ali a ascenção social e a força de toda uma nação de pobres que querem que um dos seus tenha sucesso, mas... a parte da história das crianças, por ser plausível, mexeu comigo! E a saída de tanto milhão de criaturas da miséria não é (como os milhões de rupias que levou para casa o protagonista Jamal) uma questão de destino: é algo por que tem que se lutar! Não só no próprio país, mas no mundo inteiro. E recordo o que disse o menino cego de voz de ouro (a mesma voz que o tramou em primeiro lugar): "Tu e eu somos iguais, mas tu tiveste sorte". E nós não somos diferentes de quem nasceu num bairro de lata em Bombaim (ou Mumbai, é a mesma coisa!): simplesmente nascemos no lado certo do mundo e com a pele mais clara.

Curiosamente o filme que seleccionaria como feel-good é... Milk! Objectivamente falando, mete-me nojo a realidade que retrata: tratar quem tem uma orientação sexual adulta mas desviante (OK, pode não ser a melhor palavra, mas para o caso não é grave) como pedófilo. E tratá-los como pedófilos só porque dá jeito para os retirar da vista e da vida de quem vive "como Deus quer": tendo filhos e um lar com duas pessoas de sexo diferente. Ou seja: treta da pior espécie, porque amor é amor, sexo é sexo e cada qual sabe do seu, desde que seja consensual e adulto. E homossexualidade e pedofilia não são filhos nem enteados.

E com tudo isto, porque é que me senti bem com o filme? Porque retrata algo a que não se volta. Não se volta porque uma maioria confortável de pessoas já não acha bem que se trate homossexuais daquela maneira. Não que se sintam confortáveis com a ideia (ouvi manifestações de nojo nas cenas íntimas no filme), mas isso não é o mesmo que ostracisar seres humanos como eles mesmos... mas que estranhamente se sentem sexualmente atraídos pelo mesmo sexo.

Saí do filme com a nítida sensação de ter ouvido muitos dos argumentos que ouvi dos fundamentalistas dos anos 70 em San Francisco, mas em português e de altas figuras da igreja católica (e não só) no nosso país. Mas por cada pessoa que os ouve, há um número confortável de pessoas (de tendências sexuais diversas) com vontade de os mandar para sítios pouco católicos. E que quando pressionada é capaz de fazer ver que semelhante descriminação é inaceitável.

Não digo, como é óbvio, que não se deva fazer leis contra criaturinhas como o James Franco poderem ser homem-sexuais! Tolerância é uma coisa, mas hoje é dia da mulher e isto é um homem em condições. Curiosamente é um menino de ascendência... portuguesa! E eu dizia-lhe a ascendência se o apanhasse a jeito! Já o Sean Penn pode virar quando quiser: é feio todos os dias, sempre foi e a idade não o melhorou nem um bocadinho!


Conclui-se facilmente que Deus tem um sentido de humor um pouco doentio quando fez esta criatura com a tendência sexual errada! Mas eu nunca tive ilusões de que o mundo fosse justo!

9 comentários:

Eu Mesma! disse...

Bem Abobrinha,....

por acaso ontem fui ver o Milk e ... apesar de parado o filme é muito bom....

gostei bastante apesar de ter ficado demasiado indignada com a bela da Proposta 6... como é que é possível há pouco menos de 30 anos num país supostamente super desenvolvido... existirem propostas de leis que menosprezam as pessoas por algo intimo que ninguém tem nada haver com....

confesso que fiquei indignada.. ainda mais porque conheço pessoas cuja vertenda sexual é homo (e continuo a achar que é um desperdicio porque eles são lindos como o caraças!!!!!!!! não há gordurinha fora do sitio... enfim....) e acho indecente e completamente nojento as pessoas meterem-se na casa e na cama dos outros....

e despedirem-se pessoas por isso....

Quanto ao belo do filme que ganhou os óscares.. ainda não fui ver... a maioria das pessoas diz-me que eu vou ficar hiper enojada com determinadas cenas e já me disseram para só ver o filme em DVD onde posso passar à frente....

se antes não tinha muita vontade de ir ver o filme... cada vez mais tenho menos vontade...

enfim....

Jinhos linda e
feliz dia da mulher claro!

JP disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
JP disse...

(Porra! Desculpa Abobrinha... arrependi-me do ter removido, cá estou eu novamente)

Maldito Feeds... mas porque raio me lembrei de vir ao correio? #@%$§£
Stands With a Fist, só tu para me parares a digestão do tardíssimo almoço. :(

Não vi o filme mas aguçaste-me a curiosidade, irei vê-lo.
Sentiste pela tela um pouquinho do que passei... “se o JP ir... vou chorar sangue, vou chorar sangue”... sabes ao que me refiro. Foste tão eloquente ao relatares os teus sentimentos que recuei um pouco no tempo e revi tudo novamente... o cheiro da terra... os gritos de dor... o suplicar da solidão, o embalar da morte, a palpitação da emoção... e as crianças?... a procura do amor, a dança do afecto, a carícia da alegria, o beijo do sorriso, ... continua tudo muito vivo... o apalpar da minha pele branca, o toque no meu rosto, a carícia na minha barba, os abraços, as brincadeiras, as diabruras, os defeitos ... a alegria que elas me deram suplantou qualquer espinha que me tenha ficado atravessada na garganta. Apetecia-me largar tudo e voar, voar, voar para onde a retribuição se sente bem fundo, no coração. Que seca!!!!!.... não te preocupes que não sofro do tão falado stress pós-traumático... só tu!... lol
Sabes que antes de ir não podia com crianças? Quando regressei apetecia-me adoptá-las todas, todinhas... a volta que a Vida me deu.
Temos que dar graças por aquilo que possuímos, amarmos o próximo apesar das suas ideias, e aproveitarmos o que temos para alcançar o que está para além da felicidade.
Apesar de me sentir mais morto do que vivo, afixaste um artigo muito bom. Parabéns Abobrinha!


Ahh! Neste Dia Internacional da Mulher (o que resta dele), espero e desejo que o Mulherio não se fique só pelas fotografias, há muito bom Homem às espera de ser desfolhado. lol
Feliz Dia! ... deveriam ser todos.

Abobrinha disse...

Eu Mesma

Há cenas horríveis no filme e realmente só para quem estiver na disposição "certa" (?) é que é um feel-good movie. Isso e se realmente nos mentalizarmos da nossa sorte em termos nascido do lado certo do mundo e na altura certa. Esta altura de tantas liberdades.

Em relação ao Milk, precisamente por ter havido uma mudança tão grande é que para mim é um feel-good movie. Sobretudo se te lembrares que pouco depois houve a porra da SIDA, a "doença de paneleiros" que parecia um castigo divino a ceifar a torto e a direito essa comunidade (grande parte dos intervenientes na acção morreram de SIDA, precisamente).

Hoje não se deixará que se volte a essa situação em que pessoas legislem sobre quem pode e não ir para a cama com quem... acho...

Abobrinha disse...

JP

Sim, tu viste isso ao vivo e a cores. Não sei se te invejo. Não sei se teria resistência para tanto.

E aproveitei a tua sugestão.. e coloquei num novo post um monte de homens que me apetecia... desfolhar...

Anónimo disse...

Olá dear, ontem também fui ao cinema ver este filme....
sem palavras; a miséria, o sítio do lixo, as crianças, o abandono, a miséria....
bjim

JP disse...

Abobrinha,
Não fiz nada de mais, apenas estive no local e na altura certa, nada mais.
Tou certo que terias resistência, ou até mais,... nem sonhamos a força que possuímos cá por dentro.

1REZ3 disse...

Filme feel-good mesmo é o "Happy-Go-Lucky" ("Um Dia de Cada Vez", na brilhante tradução).

Mas isto é da minha perspectiva. Como mulher, provavelmente não sentirás o mesmo...

Abobrinha disse...

DD

Estive a ver a sinopse do filme e não estou a ver em que é que ser mulher fará mudar a minha opinião acerca do filme. Mas realmente não o vi, por isso não posso dizer. Não creio que o vá ver: parece-me uma onda comercial demais para eu gastar mais de 5 euros em bilhete. Espero que saia para DVD ou que passe na televisão.