terça-feira, 27 de maio de 2008

O fim último da vida - a minha reflexão

O post anterior não gerou muita quantidade de comentários, mas gerou melhor ainda: gerou qualidade e "food for thought".

A Joaninha apontou rapidamente a falha maior deste texto: o João Pereira Coutinho (entre outras coisas tem um nome colunável) não define felicidade, só diz que o fim último da vida é a felicidade. Ou por outra o autor até define felicidade sem dizer: é não ter filhos que nos preocupem, é tê-los e não nos preocuparmos com o seu sucesso, é não ter o sucesso como meta. Há outro problema: também não define sucesso. Sucesso é felicidade? Mas se felicidade não está definida! Ou seja, o texto é completamente vazio de sentido. Inconsequente.

A vida é para ser vivida... o que é que isto quer dizer? Que a vida deve ser uma eterna festa na praia com o dinheiro dos pais? Fumar, beber, comer, ser politicamente incorrecto? Que devemos viver desprendidos de pessoas e valores? Pessoas como filhos (e pais? E irmãos? E primos? E amigos?)? Como serão as relações pessoais deste indivíduo (fora a parte dos filhos que confessamente não tem)? Como reagirá ele quando um amigo precisa da ajuda dele e de um apoio? Precisará ele de companhia para ser feliz ou a sua felicidade (o que quer que isso seja) bastar-lhe-á?

O fim último é a felicidade... mas o que é a felicidade? Parece-me mais completa a definição de felicidade da Joaninha: felicidade é espalhar a nossa felicidade pelos que nos rodeiam e fazer os outros felizes (também por nos verem e sentirem felizes). Por o inverso ser verdade, quando magoo alguém sofro em dobro: sofro o sofrimento da pessoa a quem causei dor e pela maldade que fiz em ter causado esse sofrimento. E sofro quando sei que estou a causar dor pelo meu sofrimento, apesar de nessa altura querer partilhá-lo para a tornar mais suportável... o que é um paradoxo. Mas quando estou feliz, sou uma excelente companhia. E, independentemente do que sinta, não viro as costas a quem precisa de mim e do meu apoio (a não ser se sinto que farei mais mal que bem).

O Prozac, ao contrário do que pensa o João Pereira Coutinho, não nos dá uma casa de sonho, um marido de sonho, amigos de sonho, férias de sonho. Nem o Prozac nem uma séria de outras coisas. O Prozac e outros anti-depressivos são como o gesso que se põe numa perna partida: ajuda a sarar um osso partido, mas é para tirar ao fim de um tempo. Se não se puser, o osso pode não curar em condições; se se tirar tarde demais, além de incómodo pode ainda fragilizar o osso de tal modo que parta com mais facilidade. Ou seja, é só para uma emergência. Do mesmo modo, uma vida inconsequente não nos vai necessariamente trazer a felicidade (o que quer que isso seja).

A casa de sonho só é de sonho quando ele é atingível (i.e., se pode pagar). De outro modo torna-se um pesadelo. Um marido de sonho só o é quando é real e não imaginado (quando se sabe os defeitos e qualidades e se aceita como ele é). O emprego de sonho só o é quando satisfaz a nossa necessidade de desafios e respeita a nossa necessidade de uma vida pessoal equilibrada (o que quer que equilibrado signifique para cada um).

Um filho de sonho não é o potro de corrida de que fala o João Pereira Coutinho para a maioria dos pais. Claro que um pai quer que o filho tenha sucesso e tenta dar-lhe meios. O que quer que sucesso seja. E é claro que de vez em quando comete exageros. Os pais erram, por definição. Um pai de sucesso não existe. E no entanto existe um pai feliz, o que parece um paradoxo.

Mete-me ainda impressão a parte em que ele mete meritocracia ao barulho. Mas não temos que tentar fazer o que fazemos bem? Somos todos funcionários públicos à moda antiga (recebedores de salário, não fazedores de coisas)? Não vem grande felicidade da noção de se ter feito bem o que nos foi proposto? Isto faz-me lembrar ditos célebres dos tempos de escola como "não percebia nada daquilo e tive boa nota" ou "ele não é inteligente, é marrão". O primeiro denota uma falta de empenho no que se faz e contentamento por ter pervertido um sistema que premeia o mérito; o segundo tira mérito ao que o tem (esforçou-se), porque quem é bom não se esforça mas simplesmente é bom.

Ou seja, não sei o que quer dizer meritocracia. Mas claramente, e para as coisas irem a algum lado, têm que ser bem feitas. O que pressupõe trabalho, esforço, dedicação. Mérito. Se um só se pendurar no que os outros fazem bem, é uma injustiça; se todos se pendurarem no que poucos fazem bem, o sistema colapsa mais tarde ou mais cedo, porque simplesmente não aguenta.


A parte do desprendimento humano mete-me particular aflição. Porque não está na minha natureza, mesmo sabendo que sofro com isso e quanto sofro. Os homens são animais de bando e este individualismo excessivo, esta busca desenfreada e a qualquer custo que me parece denotar este texto tem consequências. Ou só sentirá solidão quem se permite senti-la? Serão esses os fracos?

Não tenho respostas definitivas e não me parece que um autor francês com um nome chique mas dê. Parece-me que vivendo, pensando no que me faz feliz e tentando fazer os outros felizes posso eventualmente encontrar uma resposta ou várias ao longo da minha vida. Ou pelo menos tentar.

Moral da história: quer-me parecer que o texto do João Pereira Coutinho é inconsequente. Não têm mérito. Assim sendo custa-me ter visto este texto propagado como a boa-nova e multiplicado em blogues como tal. Algo está mal.

13 comentários:

Anónimo disse...

Querer definir o 'sumum bonum' já data da antquidade. Todas as correntes filosógficas e religiosas têm o seu, mas na verdade o 'maior bem' acaba por ser uma escolha individual que se altera com as circunstâncias e a idade.Para um puto de 16 anos é uma queca, para um doente é a saúde, para um toxicodependente é a droga, para um terrorista é ser mártir.Logo, a felicidade é diferente para cada indivíduo e depende das circunstâncias.
Bjs Karin

Anónimo disse...

Dear, refleti mais e de repente o autor fala é do Juízo de valor, ou seja, o valor que depositamos, ou deposita-se em algo que é fútil para alguns.
Não existe nenhum dia em que ao nos encararmos no espelho, não se questione sobre o valor, tipo: estou bem ? mal? o dia é importante? mais um dia monotono?
as contas a pagar? as crianças .. e por aí vai.
Então por dedução, cada qual coloca valor em diferentes assuntos, mas se vale a pena, isso depende!

Joaninha disse...

É isso mesmo Karin, não podia estar mais de acordo.
Por isso o texto não faz sentido, porque o conceito de felicidade é demasiado subjectivo.

Abobrinha disse...

Karin

"Sumum bonum"?? Bem, isso é que é dirty talk! Gostei! Continua!

Além do dirty talk, fazes sentido e és resumida (o que à partida me impede de gostar de ti: tenho inveja!).

Faz só uma pequena experiência: copia as 2 ou 3 primeiras linhas do texto do João Pereira Coutinho e coloca no google. Tentei fazer isso para tentar encontrar a origem do texto e citá-lo devidamente. Parei de contar às 30citações (parece-me que a maioria recebeu o texto como eu, por e-mail, porque não consigo encontrar a origem). Parece-me que a maioria das pessoas vê nele uma espécie de boa nova aos pobres. Um hino à felicidade. E eu achei-o vazio desde início. Folgo saber que os meus leitores também (mas eu sabia isso).

Abobrinha disse...

Joaninha e Karin

Vocês fazem mais sentido e são mais completas que o autor do famoso texto. Pode argumentar-se que é por serem gajas ou por terem o bom gosto de ler o meu blogue.

Já agora vão ver o comentário do Joaquim Simões no post anterior. Além de saberem que o filósofo franciú não era franciú, ficam ainda a saber que o João Pereira Coutinho não sabia sequer do que estava a falar quando citou o tipo a respeito da felicidade. Ou seja, foi inconsequente mesmo na escolha de filósofo.

O que reforça o que eu digo com frequência e que é que as leituras são como o tamanho: é o que se faz com elas que conta!

Abobrinha disse...

Raiodesol

O autor não fala de nada. É essa a conclusão a tirar. É frívolo, superficial e inconsequente. E ignorante ainda por cima (eu não sabia quem era e o que dizia o Montaigne, mas ao menos não digo asneiras acerca do assunto).

Ao contrário dele, temos que pensar no que nos faz feliz em cada altura da nossa vida e tentar alcançá-la. E, como muito bem disse a Joaninha, fazer os outros felizes à nossa volta. Se mais não for, por nos verem felizes e de bem com a vida.

Anónimo disse...

desculpe=me, é muito duro escrever q alguem q escreve é inconsequente...
amenize para, escrever e a escolha do tema para a coluna de que faz parte caiu mal!
Para escrever mal todos os textos devem ser piores ainda.
E tem mais, há quem ache dos teus!
:(
Mas discordo mais ainda, destas pequenas linhas que escrevestes, EU não tenho responsabilidade nenhuma em fazer alguem feliz, ninguerm faz o outro feliz, faço o meu melhor nas circunstancias em que estamos inseridos!
Como garantir a felicidade de um outro ser?? estás a divagar!
Vamos por partes, se eu aqui escrevo que tu me fazes infeliz, como podes melhorar isto? hum? e quem vai garantir?
Vamos lá, faça-me feliz! vou esperar sentada.

Anónimo disse...

Opções para me fazer feliz:
1- falas quem és!
2- envias uma música para mim.
3- deixa de escrever textinhos quando em vez inconsequentes.
4- hum, quero um post novo na Lavandaria, 2x por semana, e daqueles de dar otimas risadas, providencias devem ser tuas.
5- gostaria muito que voltasse a escrever como Magri.
6- gostaria de um aumento e ferias em breve, pois estou cansada.
Como és responsável, sei que me tornarás feliz.

Abobrinha disse...

Raiodesol

Eu não fui dura ao dizer que o texto do rapazinho é inconsequente e ignorante: estou a ser factual. Aceito se disserem que estou só a exprimir a minha opinião, mas dada a maneira como fundamentei a minha opinião, considero que é um facto perfeitamente indesmentível. As opiniões dos que comentaram este post e o anterior corroboram o que eu penso.

Eu não escrevo, como parece escrever-se em muitos outros blogues, para que concordem comigo, me amaciem o ego e digam como sou genial (mesmo porque esta última não é verdade).

Eu escrevo... eu não sei porque escrevo! Só escrevo! Porque me apetece! Não sou paga, não tenho um objectivo. Gostaria de ser paga (gosto de dinheiro!), mas não se pode ter tudo.

No fundo, escrever é uma das coisas que de momento me faz feliz. Escrever e ter quem leia ao meu lado e me dê algum retorno. Nas badalhoquices e não só.

Abobrinha disse...

Raiodesol

QUanto à lista:

1. QUe interesse é que isso tem? SObretudo a tanta distância? E se eu minto, como saber se estou a falar verdade?

2. Qual música? E qual é o interesse?

3. Não percebi. QUais dos meus textos são e quais não são inconsequentes? Eu escrevo o que posso.

4. A Lavandaria teve o seu pico no Expresso. O Jorge Fiel de momento deve andar ocupado demais para escrever textos inconsequentes com as graça que o caracteriza. Tudo tem o seu tempo na vida, e o tempo do "Roupa para Lavar" acabou ou ficou adiado até nova oportunidade de ser mais profícuo.

5. Magri é um nick fatela. Prefiro Abobrinha. De qualquer modo, a pessoa que escreve é a mesma, o nick é que é diferente.

6. Também eu! Há o pequeno pormenor de eu não ser a sua patroa. Mas estou a precisar de férias: hoje ia queimando o fusível!

Ao contrário do que entendeu, raiodesol, não depende de mim tornar ninguém feliz. Entre outras coisas porque as variáveis para a felicidade são muitas. Ao contrário do que pensa o rapazinho que escreveu o texto infame em questão: não basta dizer "sejam felizes"... é muito mais complicado e acho sinceramente que nestes dois posts e comentários demos achegas para como se procura a felicidade.

7.

Anónimo disse...

bom, se é para te fazer feliz, eu não serei inconsequente, leio sempre umas 4 vezes por dia o que escrevem e o que tu escreves aqui!:)
nada aprendi , mas de repente , quem sabe.
Que tal a felicidade? hum? qual o gostinho dela?
escreves mais Ok bjim
8-.

JSP disse...

Deve ter importado do castelhano...

Babylon Spanish-English

meritocracia (f)
n. meritocracy, government by the gifted or skilled, government by the intellectually worthy (rather than by family lineage or class)

É palavra que permite uns trocadilhos engraçados com mediocracia.

O fim último da vida é permanecer vivo e, de preferência, procriar. São estas talvez as únicas práticas comuns a todos os seres vivos e ainda aquelas que nenhum ente não-vivo faz.

Tendo isto em conta, talvez essa história das festas na praia à pala dos pais para toda a vida tenha mais que um fundo de verdade. Digo eu.

Abobrinha disse...

J...

Benvindo (assumo que seja um menino) ao meu tasco. Eu digo sempre que não se aprende nada aqui porque a maioria dos posts são bem mais ligeirinhos.

A história das festas na praia à pala dos pais é mais grave: muito boa gente anda excessivamente infantilizada. Muitas vezes com o patrocínio voluntário de pais que não querem que eles cresçam, que querem ser necessários. Mas outras vezes encostando-se aos pais porque é mais conveniente.

Casos mais chatos são quando temos mesmo que recorrer aos pais porque realmente estamos incapazes. Porque escorregamos na busca da felicidade. É complicado.

Quanto à meritocracia, eu não entendo mesmo o que é que muito boa gente tem contra ela. E sobretudo não entendo qual é a alternativa. Não há nada de errado com ser médio, mas o objectivo tem que ser ir mais além. E ser efectivamente governado por quem é mais e não por quem é médio. Pois se o médio é como os outros, porque é que se é governado por um médio e não pelo outro? Qual é o critério? Estranho!

O que me parece é que o João Pereira Coutinho não quer crescer. Impressão que ficou reforçada neste texto (a segunda parte só). Ou que escreve como se fosse ele o centro do mundo. O que significa que daqui a 20 anos o vamos estar a ler em odes à meia-idade. E quando tiver filhos vai destilar todo o amor que lhes tem e as maravilhas da paternidade.