sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Uma vénia a um cientista honesto!

No caso, uma cientista: Rosalind Harding, que acabei de ouvir na Fundação Serralves numa apresentação intitulada "Diversidade Genética: uma Perspectiva Antropológica".

Onde "mora": http://www.stats.ox.ac.uk/~harding/index.htm

Feliz ou infelizmente, a componente científica deste post vai ser reduzida. Felizmente porque a densidade de informação foi imensa e extremamente honesta. Infelizmente porque a maioria do que a Rosalind Harding disse me passou ao lado porque não sou competente para acompanhar tudo o que ela disse.

Esta série de 4 conferências teve obviamente o seu ponto baixo com o Tim Crow (como expliquei anteriormente aqui) que é de Oxford como a Rosalind. Lá está: uma figueira dá muitos ramos! A quem interessar, o post a que faço referência tem um comentário recente de outra pessoa que lá esteve e achou o mesmo que eu e ainda mais, pelo que recomendo a leitura.

As duas primeiras conferências foram boas, mas um pouco pela rama. Um pouco mais divulgação científica, o que foi excelente também. Mas a Rosalind Harding falou quase como quem fala com os seus pares. Como não era o caso, fiquei pelo caminho na esmagadora maioria das coisas, mas não fiquei mais burra (muito pelo contrário). Este post é contrário à fama de refilona com que um grande pensador português me rotulou (isso! Dá graxa!): é um post de admiração pura e dura. Abobrinha não é só refilona!

Esta conferência tinha uma componente muito grande de genética, ao contrário da do Tim Crow. E, como o nome indicava, também atropológica. Fiquei logo de pé atrás porque pensei: lá vem mais um tocar mais que um instrumento que não domina. Mas não foi o caso.

A Rosalind Harding fez paralelos com os nossos primos mais próximos, os chimpanzés. Estes apresentam duas subespécies, muito parecidas entre si. Do mesmo modo poderiam o Neanthertal e o homem moderno ter coexistido (antes de o Neanthertal ter ido para o galheiro) como subespécies e não como espécies separadas. Palavra-chave: poderiam!

A apresentação de uma hipótese de que poderia ter havido mistura com os Neanthertais a dada altura, já fora de África, na migração para a Europa foi apresentada junto com a hipótese oposta. Quando questionada sobre isso, disse que não era uma certeza mas uma hipótese consistente com algumas observações para certos genes. Se a tendência durasse (palavras dela), ou seja, se o comportamento de mais genes fossem consistentes com essa observação, era era possível que essa hipótese tivesse pernas para andar. Mas se não, possivelmente não seria sustentável e cairia por terra porque só um par de genes ser consistente com aquela hipótese não seria suficiente para validar a hipótese.

Recordo que ela apresentou as duas hipóteses e exprimiu dúvida. A dúvida saudável do esperar para ver. De facto, quando questionada apresentou ainda mais dúvidas: não sabe se de facto o homem moderno e o Neanthertal eram subespécies ou espécies separadas sequer! Mas acha que poderão ter sido só subespécies. Pode ou não conseguir provar isso. E disse coisas como "não sei se algum dia poderemos saber isso" a respeito de qualquer coisa qualquer que não me lembro. É de gaja!

A elegância da apresentação da Rosalind foi ainda maior que a sua elegância física (e ela é muito elegante!). A argumentação com os moderadores (no caso só com o António Amorim, porque o Sobrinho Simões não a questionou) foi um espanto: de uma fluidez que o Tim Crow só pode sonhar para um dia, quando for grande! E pelos vistos estava adoentada! Faço ideia com o gás todo do que aquela mulher será capaz! Ela é que é a verdadeira refilona, e ainda por cima com um sorriso nos lábios!

Na discussão compreendi por que motivo o António Amorim estava tão abespinhado com quem questionava o Tim Crow: disse que não era darwiniano. Com uma apresentação darwiniana pura e dura (palavras dela), a Rosalind Harding candidatou-se a uma discussão muito acesa. E ficou por cima! Mas isso deduzo pela expressão do próprio António Amorim, que disse algo como que se rendia: a discussão deles mesmo eu não entendi porque era demais para mim. O que também não compreendi é o que é não ser darwiniano!

No capítulo de futilidades, a fotografia do site dela só lhe evidencia o enorme sorriso. Mas ela é muito mais bonita em pessoa (mas eu tenho uma coisa por ruivas). Mal abriu a boca também se notou que era ligeiramente sopinha de massinha... e mais australiana só se dissesse "G'day mate" e "Chee's Gov'ner". Ou seja, só aí marcou pontos! É que eu não sou superficial, mas tenho uma atenção muito grande a certos pormenores, e o sotaque é um deles.

Gostei! Senti-me ignorante mas no bom sentido: com vontade de aprender mais! E foi uma lição ver a honestidade intelectual de quem não acha que a dúvida é uma fraqueza. Pode parecer mais bombástico vir debitar postas de pescada e certezas, mas isso pode ter mau resultado quando se encontra um público mais esclarecido. Foi o caso do Tim Crow, que apanhou uma abada em Serralves (essencialmente dos arqueólogos)... mas que possivelmente nem sequer teve capacidade para encaixar isso, porque se refugia em "ah, isto é especulativo" (opinião de Moura, que comentou o meu post sobre o Tim Crow, e que eu subscrevo inteiramente).

Infelizmente acabaram as conferências de Biologia! Quero mais! Felizmente encontrei cosméticos da MAC. E não foi o Pai Natal que me ajudou!

2 comentários:

Manuel Rocha disse...

Aquela palavra chave do "poderiam" deveria ser muito mais usada do que é no dominio das ciências em geral. E sobretudo não se deveria perde-la quando transposta para os manuais escolares, sob pena de culturalmente se dar por adquirido o que são teorias pouco fundamentadas ou, pior, hipóteses que dificilmente poderão ser levadas mais longe.

Abobrinha disse...

Manuel

E porquê ficar só pelas Ciências e educação? Porque não pela política, pela vida quotidiana?

A dúvida, o questionar são importantes. Claro que não podem ser valores absolutos em todos os aspectos da vida, porque senão damos em loucos. É um dos motivos porque gosto tanto do blogue do Ludwig: concordando ou não com o que lá se escreve, questiono, consolido ideias. Para muitas vezes ainda ficar com mais dúvidas!

Neste momento não tenho grandes dúvidas de uma coisa: estou muito cansada, por isso incapaz de grandes filosofias. Não dá para comentar no Que Treta hoje por um motivo: não consigo entender o que está lá escrito! Mas parece-me bem! Estou a dever umas horas à cama esta semana... e preciso de férias.